segunda-feira, agosto 25, 2008

LUPE (poema de Roberto Bolaño)

LUPE

Trabalhava na avenida Guerrero, a poucas quadras da casa de Julián
E tinha 17 anos e havia perdido um filho.
A lembrança a fazia chorar naquele quarto do hotel Trébol,
espaçoso e escuro, com chuveiro e bidê, o lugar ideal
para se viver por alguns anos. O lugar ideal para escrever
um livro de memórias apócrifas ou um ramalhete
de poemas de terror. Lupe
era magra e tinha as pernas compridas e manchadas
como as dos leopardos.
A primeira vez nem sequer tive uma ereção:
tampouco esperava ter uma ereção. Lupe falou de sua vida
e do que era a felicidade para ela.
Depois de uma semana voltamos a nos ver. Encontrei-a
numa esquina junto com outras putinhas adolescentes,
apoiada nos paralamas de um velho Cadillac.
Acho que ficamos felizes em nos ver. A partir de então
Lupe começou a me contar coisas de sua vida, às vezes chorando,
às vezes trepando, quase sempre pelados na cama,
olhando o céu raso de mãos dadas.
Seu filho nasceu doente e Lupe prometeu à Virgem
que largaria sua profissão deixaria se seu bebê sarasse.
Manteve a promessa por um mês ou dois e logo teve que voltar.
Pouco depois seu filho morreu e Lupe dizia que a culpa
era dela por não comprir o prometido à Virgem.
A Virgem levou seu anjinho por sua promessa não cumprida.
Não sabia o que lhe dizer.
Eu gostava de crianças, claro,
mas ainda faltavam muitos anos para que soubesse
o que era ter um filho.
Por isso ficava quieto e pensava em como era estranho
o silêncio daquele hotel.
Ou tinha as paredes muito grossas ou éramos os únicos ocupantes
ou os demais não abriam a boca nem para gemer.
Era tão fácil lidar com a Lupe e sentir-se homem
e sentir-se um infeliz. Era fácil acompanhar seu
ritmo e era fácil ouví-la se referir
aos últimos filmes de terror que havia visto
no cine Bucareli.
Suas pernas de leopardo enlaçavam meus quadris
E afundava sua cabeça no meu peito procurando meus mamilos
ou o latido do meu coração.
É isso o que eu quero chupar, me disse uma noite.
O que, Lupe? Seu coração.

ROBERTO BOLAÑO

TRADUÇÃO: RODRIGO GARCIA LOPES



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